GÊNERO E RAÇA: Uma análise sobre a participação da mulher negra em ambientes organizacionais

ANTONIA AURIANE DE SOUSA SILVA
ANTONIA RAFAELA DA SILVA
RUTHELLE MARIA DE CARVALHO SOUSA

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo identificar as dificuldades enfrentadas por mulheres negras na inserção ao mercado de trabalho, levando em consideração a evolução histórica e parâmetros sociais que ainda são determinantes dentro da sociedade e das organizações nos dias atuais. A metodologia utilizada se deu por meio de uma pesquisa exploratória, com abordagem qualitativa, através de uma análise bibliográfica da literatura já existente. A pesquisa levou 4 meses para a sua construção e os resultados apontaram que mesmo após todos os movimentos criados ao passar dos anos, muitas situações ainda se repetem no dia a dia das mulheres negras, principalmente no seu ambiente de trabalho, onde sofrem assédios e não recebem a visibilidade e reconhecimento da maneira correta.

Palavras-chave: Sociedade; Racismo; Mercado de trabalho.

ABSTRACT

The present work aims to identify the difficulties faced by black women in entering the labor market, taking into account the historical evolution and social parameters that are still determinant within society and organizations today. The methodology used was through an exploratory research, with a qualitative approach, through a bibliographical analysis of the existing literature. The research took 4 months to complete and the results showed that even after all the movements created over the years, many situations are still repeated in the daily lives of black women, especially in their work environment, where they suffer harassment and do not receive visibility and recognition in the right way.

Keywords: Society; Racism; Labor market.

1 INTRODUÇÃO

Mesmo após mais de um século da abolição da escravatura no Brasil, as marcas deste período ainda se tornam presentes. É indubitável negar que mesmo depois de anos, a população negra ainda se encontra inferior à população branca, e  quando trazemos essa realidade para a classe de mulheres negras, a situação é  ainda mais agravante.

A população negra tornou-se livre em 1888, através da assinatura da Lei Áurea, porém ainda continuou por muito tempo sendo excluída e intitulados como incapazes comparados aos imigrantes europeus que vinham para trabalhar no Brasil naquela  época, e mesmo considerados legalmente livres e cidadãos, negros não participavam das esferas sociais, além de serem privados de benefícios sociais (ALVES, 2020).

Estudos voltados para temáticas raciais dentro de ambientes organizacionais ainda que trabalhados de forma mais aprofundada, não ameniza as práticas opressoras e excludentes envolvendo classe de mulheres negras, uma vez que inter-relação entre racismo e sexismo são o eixo para a constante prática da interseccionalidade com mulheres negras (Oliveira, 2021). Ainda segundo o autor, a adversidade sofrida por mulheres negras dentro de ambientes organizacionais em toda a história foi uma realidade, pois a união do racismo, da opressão de classes e a vigência do patriarcado espelham um sistema de discriminação e a supressão.

Busca-se assim, como objetivo geral do estudo identificar as dificuldades enfrentadas por mulheres negras na inserção ao mercado de trabalho e para alcançar o objetivo geral busca-se como objetivos específicos: (a) Analisar a evolução histórica da participação de mulheres negras no mercado de trabalho; (b) Investigar o nível de escolaridade e qualificação profissional de mulheres negras; (c) Identificar os desafios enfrentados por mulheres negras na inserção no ambiente organizacional; e (d) Analisar até que ponto a objetificação e marginalização da mulher negra impactam no ambiente organizacional.

O estudo irá abordar questionamentos relevantes sobre como mesmo  com tanta preocupação da sociedade atual relacionada a igualdade de direitos de gênero e raça, ainda é persistente em grandes organizações, a prática do preconceito com pessoas de pele negra, em especial as mulheres negras, posto a situação se torna ainda mais delicada com estas, investigando quais os principais desafios que essas mulheres enfrentam ao ingressarem no meio organizacional.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Parâmetros históricos da mulher negra na sociedade e no mercado de trabalho.

Humilhadas, objetificação, vítimas de marginalização e enxergadas apenas como mão de obra a ser exploradas, assim era a realidade da mulher negra no período da escravidão (Barbosa, 2022). Ainda de acordo com o autor, mulheres negras no período escravocrata não possuíam sequer a autoridade de escolher o que queriam, além de serem subjugadas e estarem à mercê das atrocidades em suas condições de trabalho.

No período escravocrata, além de serem vítimas do preconceito pela sociedade, mulheres negras passavam por maus tratos comuns praticados pelos seus senhores, e somente depois da assinatura da lei Aurea pela Princesa Isabel em 13 de maio de 1888, mulheres e homens negros se tornaram pessoas livres deixando a condição de escravos, mas ainda assim a sua mão de obra era desprezada pela forte presença do preconceito racial (Baptista, 2016).

Diferente do que se pensa, o sofrimento das mulheres não no período da escravidão não foi menor que o de homens negros, uma vez que estas eram expostas a condições insalubres de trabalho, mesmo atuando como domésticas, sendo babás ou cozinheiras, eram submetidas a humilhações, e diferentes dos homens, as mulheres negras eram violentadas sexualmente por seus senhores (Barbosa, 2022).

A partir do anos 2000, o cenário do mercado de trabalho no Brasil passou por mudanças , proporcionando melhorias, entretanto, a população negra, tanto homens como mulheres não foram totalmente incluídos em tais melhorias, umas vez que mesmo com o passar dos anos, em virtude de suas raízes associadas a escravidão, ainda são vistos como mão de obra barata, além de serem direcionados a prática de atividades precárias e marginais que são advindas da recorrente discriminação que o povo negro sofre (Lima, 2021).

Assim, analisando as narrativas dos autores citados, torna-se perceptível que a mulher negra dentro da sociedade, desde muito cedo sempre foi rebaixada e discriminada, e mesmo após a abolição da escravatura no Brasil continuavam não sendo bem-vistas perante a sociedade, tal discriminação mesmo depois de muitos anos ainda torna-se persistente.

2.2 Mulheres negras e o acesso à educação

Desde o período colonial sabe-se que os direitos das pessoas de cor negra eram bem restritos, mesmo após a abolição da escravatura, as tarefas concedidas aos negros, principalmente as mulheres, eram bem parecidos aos da época da escravidão, elas não tinham acesso nem a educação e nem a saúde, ou seja, não possuíam uma vida digna e nem próxima da realidade que as pessoas de pele branca possuíam. E esses fatos só se agravaram cada vez mais, as mulheres não conseguiam nem mesmo participar da criação dos seus filhos, pois continuavam a exercer funções de empregadas e babás das mulheres brancas de forma que chegava a ser exploração (Henriques, 2017).

Ainda segundo o autor acima, mesmo após a promulgação da lei 1331-A, em 1854, a legislação que regulamentava o ensino primário, secundário e a população vacina, ainda assim, esses direitos não incluíam as pessoas negras. Logo mais, no governo republicano outras reformas educacionais foram feitas, porém nada que chegasse a abranger a esta população que tanto necessitava.

Foi a partir principalmente das políticas de cotas que essa realidade mudou, pois no quesito de educação superior passou-se a ser dado mais oportunidade a população negra ingressar em cursos que alto prestígio, que antes somente eram almejados a população rica e de pele branca. A política de cotas foi um marco muito grande para a população negra, porém ainda divide opiniões. O sistema de cotas nas universidades geralmente se divide em dois o primeiro inclui a população que estudou seu ensino médio em escolas públicas e a outra que engloba os estudantes que se autodeclaram negros, pardos ou indígenas (Assunção, 2015).

A política de cotas foi criada após a Conferência Mundial contra o racismo em 2001, onde os resultados encontrados foram tão negativos, que moveram para a criação da política de cotas raciais nas universidades. Porém até hoje mesmo com cotas e com estratégias voltadas a esta temática, não forma suficientes para reparar todo o preconceito e discriminação histórica sofrida pela população negra, as taxas de analfabetismo entre os negros apesar de terem diminuído, ainda continua bastante expressiva, essas desigualdades ocorrem em especial as mulheres, que ainda são tão pouco vistas nos altos cargos das sociedades e que ainda ganham muito menos que os homens de pele branca, mesmo quando exercem as mesmas funções (Lerner, 2014).

Desde o período colonial as mulheres eram excluídas e até mesmo proibidas de terem acesso a educação, com o passar dos anos e a evolução dos povos, essa realidade teve uma mudança significativa e as oportunidades começaram a surgir, principalmente com o advento do sistema de cotas, porém, essa é uma realidade que não engloba totalmente essa classe, tendo em vista que as mulheres negras ainda sentem essa exclusão.

2.3 O ambiente organizacional e os desafios da mulher negra

A discriminação das mulheres negras é um assunto que é bastante discutindo, e por sua vez, ainda bastante recorrente, principalmente no mercado de trabalho, desde as primeiras colonizações, as mulheres em especial as negras, exerciam funções apenas domésticas, mesmo com toda a evolução da sociedade e das leis que protegem essa população da discriminação, ainda vemos muito o conceito de babás e empregadas domésticas atreladas as mulheres negras, pois elas sempre foram vistas como pessoas sensíveis e inferiores aos homens. Esses foram os principais fatores que ocasionaram a dificuldade de as mulheres chegarem hoje aos altos cargos executivos (Lima, et al, 2013).

Esse comportamento de ser sempre submissa a alguém, é um fator bastante pertinente, nos tempos antigos, as mulheres negras eram submissas as suas patroas brancas de classe superior, e em casa ainda eram submissas aos seus maridos, atualmente a situação se repete, principalmente no mercado de trabalho, onde as mulheres são submissas aos seus chefes e encarregados na sua maioria (Braz, Benevides, 2019).

Assim como em casa e na escola as mulheres negras continuam a sentir a exclusão e desvalorização, exclusivamente por serem negras, no ambiente organizacional a situação se repete, mulheres que possuem as mesmas qualificações, porém não têm as oportunidades de ingressarem e se destacarem nas organizações, porque os altos cargos em sua maioria seguem um padrão de cor de pele e gênero.

2.4 Objetificação e marginalização da mulher negra

Desde a época colonial até os dias atuais a objetificação e marginalização da mulher negra e de seu corpo, está presente na sociedade brasileira. Da Costa (2019), disserta que tais ações se desenvolveram através de um processo de desvalorização estética e social, estes que foram posteriormente responsáveis por todo o olhar de inferioridade estereotipados no meio social em relação às mulheres. Deste modo, torna-se possível compreender que tais ações culminaram nas explorações psicológicas, sexuais, verbais e físicas a que mulheres negras estiveram submetidas.

A discriminação racial juntamente com a prática do sexismo apresenta-se como uma neurose cultural dentro da sociedade brasileira, uma vez que a figura da mulher negra constantemente é retratada pelo protótipo da “mulata fogosa e boa de cama”, provocando desta maneira, a inferiorização em relação ao corpo da mulher negra e criando assim, um imaginário superficial destas (Da Cunha; Paiva, 2017).

A objetificação do corpo da mulher negra fica explícito quando se é reproduzida a frase popular “Branca para se casar, mulata para fornicar, negra para trabalhar”, a utilização dessa fala reforça desvalorização e marginalização do corpo da mulher negra na sociedade brasileira, dificultando cada vez mais a existência do respeito com estas (Oliveira, 2021).

As barreiras sociais ainda são muito presentes nos tempos atuais dentro da sociedade brasileira, estas que são reflexos das desigualdades sociais e raciais, decorrentes do preconceito e estereótipo de que as mulheres negras só podem desenvolver atividades domésticas ou serem objetos/presas sexuais exibindo seus corpos, e tudo isso se constata pela historicidade do sofrimento de uma classe de mulheres que foi irresponsavelmente desrespeitada e violentada sexualmente no período escravocrata e ao longo dos anos.

3 METODOLOGIA

A presente pesquisa classifica-se como qualitativa quanto à sua abordagem. Para Da Silva (2005), a pesquisa qualitativa é aquela que estabelece um vínculo entre o mundo objetivo e a subjetividade, onde as informações não se traduzem em números, pois os significados e atribuições dentro de uma pesquisa qualitativa devem ser básicos, não sendo feito uso de dados estatísticos, a pesquisa de abordagem qualitativa considera a existência de uma relação dinâmica e harmônica entre o sujeito e o mundo real.

Já quanto aos procedimentos, se trata de uma pesquisa bibliográfica. A pesquisa bibliográfica é aquela que descreve um fato ou problema de forma mais aprofundada e que é construída a partir de dados encontrados em livros, artigos, monografias e outras fontes científicas (Beuren, 2013). Como complemento Nascimento (2016) acrescenta ainda que de certa forma todas as pesquisas possuem em sua construção uma parte bibliográfica, porém existem pesquisas que seguem somente com essa classificação. Esse tipo de pesquisa ajuda a criar uma maior familiarização do pesquisador com o tema. Quanto aos seus objetivos, a presente pesquisa caracteriza-se como exploratória. A finalidade da pesquisa exploratória é possibilitar uma familiaridade mais detalhada e aprofundada com determinado problema, objetivando torná-lo mais explícito (Da Silva, 2005).

A pesquisa em geral teve uma duração de 4 meses, onde inicialmente foi feito a definição do problema e objetivos da pesquisa. Posteriormente, realizou-se o levantamento bibliográfico para a construção da base teórica e conclusão do estudo.

 4 RESULTADOS E DISCUSSÕES

A escravidão deixou na sociedade brasileira um legado de racismo, este por sua vez muito fortificado privilegiando classes elitistas. Mesmo com a abolição da escravidão em 1888, a presença de discursos desrespeitosos e cruéis direcionados a população negra, tais discursos desmoralizantes e preconceituosos tornam evidentes que homens e mulheres negras tiveram seus direitos negados, sendo por muito tempo excluídos da sociedade e impedidos de desfrutarem das mesmas condições de trabalhos que os brancos (Santos, 2019).

A participação de mulheres negras dentro do mercado de trabalho se restringe a subempregos, especialmente como empregadas domésticas, mesmo quando algumas delas possuem graus de escolarização elevados, dificultando assim o acesso destas a cargos mais elevados, cargos de chefia. Toda essa restrição acontece em virtude da sociedade racista, machista e sexista a qual estas mulheres estão inseridas, no entanto mesmo com tantas dificuldades e tamanha discriminação, as lutas por melhores participações no mercado de trabalho e reafirmação de que merecem reconhecimento são constantes (Santos, 2019).

Diante do que foi exposto, nota-se que mesmo com o passar dos anos, com abolição da escravidão há muito tempo atrás, a população negra, especialmente mulheres negras sofrem discriminação e dificuldade para o ingresso no mercado de trabalho, e quando conseguem este acesso, são designadas a cargos e atividades não tão importantes, pois o racismo enraizado na sociedade brasileira não permite que muitas mulheres negras componentes e qualificadas a realizar diversas atividades impossibilitam sua ascensão.

A sociedade atual ainda é muito machista, tratando as mulheres no geral como inferiores aos homens, mesmo com anos de lutas de vários movimentos, especialmente o feminista. Diariamente se houve notícias de agressão a mulheres seja no ambiente familiar ou profissional, simplesmente pelo de fato de serem mulheres e taxadas como sexo frágil que deve se colocar em posição inferior. Tal situação se torna ainda mais crítica quando se trata de mulheres negras, pois além de lidarem com a discriminação de gênero, ainda sofrem o racismo estrutural, e no âmbito profissional a desigualdade social em virtude de sua cor as levas a ocupação de cargos com baixo prestígio, pois há anos lhe são atribuídas a funções como faxineiras e cozinheiras, estas que vistas pela sociedade como atividades de pouca autoridade (Barbosa, 2022).

Em relação ao segundo objeto que busca investigar o nível de escolaridade e qualificação profissional de mulheres negras vai de encontro ao estudo de Artes e Unbehaum (2021) onde em seus resultados identifica que a presença de estudantes negros nas escolas e universidades tem aumentado bastante, entretanto, quando se faz um comparativo desses percentuais com a população em geral, os números se tornam muito distantes do ideal. Essa população começa a enfrentar desafios desde antes da inserção nas universidades, na educação básica, no ensino médio eles já tem diversos obstáculos para suportarem.

Queiroz e Santos (2016) também destaca em sua pesquisa que ao analisar a ingresso dos acadêmicos por gênero em cursos de alto prestígio as mulheres brancas quase que se igualam aos percentuais dos homens, porém as mulheres negras mesmo com os sistemas de cotas, sua participação ainda é a mais baixa. Concluiu que as mulheres negras possuem uma desvantagem muito grande em relação as mulheres brancas, pois até mesmo quando elas conseguem quebrar essas barreiras iniciais e ingressam nos cursos de seus sonhos, começa outra batalha ao terem que lidar com a estranheza dia a dia.

O terceiro objeto do presente estudo busca identificar os desafios enfrentados por mulheres negras na inserção do ambiente organizacional, visto que observamos que nas grandes empresas, nos altos cargos da sociedade pouquíssimos são ocupados por mulheres negras, com isso buscamos analisar o porquê dessa situação ainda acontecer até os dias atuais e quais as dificuldades enfrentadas na rotina dessas mulheres no seu ambiente de trabalho.

Mesmo com muitas mulheres negras na organização, na maioria das vezes, elas não estão em cargos de liderança, embora essas mulheres sejam tão qualificadas quanto os que ocupam os cargos mais almejados. Nessa realidade também podemos citar a questão do assédio, que muitas vezes é o fator mais agravante para que as mulheres não sigam no alcance dos seus objetivos de carreira, desde cedo elas são ensinadas a lidar com o sexismo e quando ocupam cargos mais elevados isso só aumenta. Outro fator que impede essa evolução organizacional é o fato de tornarem-se mães e ter que lidar com críticas de que não dariam conta dos filhos e de seus afazeres profissionais ou de nem serem contratadas simplesmente por terem filhos (Oliveira, 2021).

As organizações nos dias atuais, embora em seus códigos de conduta repreendem comportamentos inaceitáveis como racismo, sexismos, machismo e homofobia, são míopes e coniventes quando tais situações ocorrem, e se utilizam dos dispositivos apenas para não sofrerem processos judiciais, e assim não desempenham de maneira eficiente as políticas de diversidade previstas em lei, uma delas é a não presença de sanções racistas, que por meio de advertências e penalizações ao agressor, os código adotados por algumas organizações deixariam de ser apenas dispositivos dialéticos (Oliveira, 2021).

Analisando os estudos expostos até aqui, fica claro que a população negra, em especial, mulheres negras precisam lutar muito para serem tratadas com a dignidade que realmente merecem, uma vez que em suas vidas e seus corpos reprimidos desde muitos anos atrás. A objetificação e sexualização do corpo negro ainda é algo muito presente em diferentes aspectos na sociedade brasileira, o machismo aliado ao racismo expõem cada vez mais mulheres, a fim de diminui-las e expô-las como objetos. Assim, é de extrema necessidade que busquemos combater tais acontecimentos, apoiar movimentos que defendem mulheres e a população negra é uma ação que deve ganhar cada vez mais força, só assim será possível acreditar em mundo melhor, onde haja igualdade e equidade para todos.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A sociedade brasileira é marcada pelo racismo enraizado desde o período colonial. Mesmo após anos de lutas e algumas conquistas, a prática do preconceito é muito frequente, em muitas das vezes a sociedade fecha os olhos para tais práticas no dia a dia. Mulheres negras sofrem desde sempre com as práticas de machismo, racismo e sexismos juntos, uma vez que além de serem intituladas como o sexo frágil, ainda são tratadas com inferioridade pela sociedade em virtude de sua cor. Dentro do mercado de trabalho a inserção de mulheres negras ainda ocorre de maneira lenta, embora estejam ganhando espaços aos poucos, na maioria das vezes ocupam cargos de pouca importância.

Diante de tudo de que foi exposto até aqui, pode-se perceber que a luta pelos direitos das mulheres em geral, e em especial de mulheres negras torna-se cada vez mais necessária, uma vez que mesmo se passando anos e havendo grandes movimentos e lutas pelos direitos das mulheres e de pessoas negras, a prática do racismo, aliada ao machismo e sexismo ainda se faz muito presente dentro dos ambientes organizacionais.

Assim, surgem como sugestões para estudos futuros, pesquisas qualitativas através de entrevistas semiestruturadas com mulheres negras em organizações, para indagá-las sobre como se sentem nas organizações as quais trabalham, se sentemse seguras, respeitadas e se já sofreram qualquer tipo de discriminação, seja ela machista, racista ou sexista.

REFERÊNCIAS

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ANTÔNIA AURIANE DE SOUSA SILVA é egressa do Bacharelado em Administração do Instituto Federal do Piauí- IFPI, campus Campo Maior.

ANTÔNIA RAFAELA DA SILVA é egressa do Bacharelado em Administração do Instituto Federal do Piauí- IFPI, campus Campo Maior.

RUTHELLE MARIA DE CARVALHO SOUSA é docente do Eixo de Gestão e Negócio do Instituto Federal do Piauí- IFPI, campus Campo Maior. E-mail: ruthelle.carvalho@ifpi.edu.br

SEMANA NACIONAL DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA 2023 – IFPI Campo Maior

RAFAEL SALES ALMENDRA

De acordo com a legislação brasileira, os Institutos Federais têm a missão de impulsionar ações que contribuam para a sustentabilidade e a busca por soluções que garantam a preservação ambiental. Nesse contexto, a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia 2023 (SNCT-2023) teve como temática “Ciências Básicas para o Desenvolvimento Sustentável” a qual propôs a integração e a interação entre diversas disciplinas científicas para abordar os desafios relacionados ao desenvolvimento sustentável destacando a importância das ciências básicas, como a física, a química, a biologia e a matemática, na compreensão dos fenômenos naturais e na busca por soluções inovadoras que promovam a sustentabilidade ambiental, social e econômica.

Em 14 de outubro de 2023, deu-se início às atividades alusivas à Semana Nacional de Ciência e Tecnologia no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia – Campus Campo Maior, o qual teve como ponto de partida a ocorrência do eclipse solar anular. Os eclipses solares são eventos astronômicos que ocorrem quando o Sol, a Lua e a Terra se alinham de maneira única, permitindo que a Lua oculte temporariamente o disco solar. Um tipo especial de eclipse, conhecido como eclipse solar anular, ocorre quando a Lua está mais distante da Terra em sua órbita elíptica, resultando em um anel de luz solar visível ao redor da silhueta da Lua. Este fenômeno celeste não apenas fascinou observadores em todo o mundo, mas também proporcionou uma oportunidade única para relacionar a ciência e a educação.

Uma das iniciativas ligadas a esse evento foi a forma como o IFPI – Campus Campo Maior se envolveu para educar e conscientizar a comunidade sobre o eclipse. Na semana que antecedeu o fenômeno, o Campus utilizou-se de suas redes sociais para informar à população sobre a ocorrência do eclipse e fornecer orientações sobre como visualizá-lo com segurança. Através de postagens informativas, foram compartilhados detalhes sobre horários de ocorrência do eclipse, a importância de usar óculos de proteção solar aprovados para observar o evento e a localização de pontos de observação seguros na cidade. Além disso, destacou-se a relevância desse fenômeno astronômico e seu vínculo com a abertura da SNCT-2023.

Semana Nacional de Ciência e Tecnologia

Na cidade de Campo Maior-PI, o eclipse teve início às 15h19 (horário de Brasília). A anularidade, que é o momento em que a Lua cobre completamente o centro do Sol, ocorreu às 16h41. O eclipse foi um espetáculo da natureza, onde a comunidade do IFPI – Campus Campo Maior pôde contemplar a beleza do fenômeno e refletir sobre a importância da astronomia no contexto das ciências e do desenvolvimento sustentável.

Dando continuidade ao evento, em 04 de dezembro de 2023, ocorreu a cerimônia que destacou a importância da ciência e da tecnologia no desenvolvimento regional e nacional, culminando com a mostra intitulada por “O ambiente físico, social, as condições de trabalho docente e o ensino de matemática no cotidiano das escolas municipais de Campo Maior- PI”. O evento foi organizado pela equipe da Profa. Sebastiana Ceci e teve como objetivo discutir os desafios do ensino de matemática nas escolas municipais da cidade. A mostra contou com a participação de professores, gestores escolares, pesquisadores e estudantes. Os participantes puderam visitar as exposições de trabalhos desenvolvidos por alunos e professores de Matemática do IFPI-Campus Campo Maior.

Um dos temas discutidos na mostra foi a importância do ambiente físico para o ensino de matemática. Os participantes concluíram que as escolas precisam oferecer espaços adequados para o aprendizado da matemática, com salas de aula bem iluminadas e ventiladas, materiais didáticos adequados e equipamentos tecnológicos propícios ao ensino desta ciência. A mostra foi um importante passo para a melhoria do ensino de matemática nas escolas e os participantes puderam refletir sobre os desafios da profissão e construir propostas para melhorar a qualidade do ensino.

No dia 05 de dezembro de 2023 ocorreram as exposições de banners, com o objetivo de apresentar os trabalhos desenvolvidos por alunos do Ensino Médio e Concomitante sobre as temáticas trabalhadas nas disciplinas de Projeto Integrador. Os trabalhos apresentados foram de demonstraram o interesse dos alunos pelas temáticas trabalhadas, uma vez que os banners foram criativos e informativos, e transmitiram de forma clara e didática os conceitos relacionados ao tema.

Semana Nacional de Ciência e Tecnologia

A palestra “TI VERDE: a tecno(eco)logia do presente” foi realizada no dia 06 de dezembro de 2023, no auditório do IFPI – Campus Campo Maior. A atividade, conduzida pelo Prof. Wilson Júnior teve como objetivo discutir a importância da TI Verde para o desenvolvimento sustentável. O palestrante apresentou os conceitos básicos da TI Verde, discutiu os benefícios da adoção de práticas sustentáveis na TI e apresentou exemplos de boas práticas que podem ser adotadas pelas empresas para tornar a sua TI mais sustentável.

Por conseguinte, a mesa redonda “Sustentabilidade nas micro e pequenas empresas: boas práticas e desafios” objetivou discutir as boas práticas e os desafios da sustentabilidade nas micro e pequenas empresas. A mesa contou com a participação de professores do Eixo de Gestão e Negócios do Campus Campo Maior do IFPI que discutiram como as micro e pequenas empresas podem adotar práticas sustentáveis e os desafios que enfrentam para isso, tais como falta de recursos, informações e apoio governamental. Também foram abordadas as boas práticas que podem ser adotadas pelas micro e pequenas empresas para tornar a sua operação mais sustentável. Dentre essas práticas, destacam-se a redução do consumo de energia e água, a redução da geração de resíduos e o uso de produtos e serviços sustentáveis como energia renovável e materiais reciclados.

Com o intuito de divulgar e promover o conhecimento científico nas áreas das ciências básicas, destacando sua importância para o desenvolvimento sustentável, os professores das áreas de Física, Química e Biologia do Campus Campo Maior levaram a Exposição Científica – Ciências Básicas para o Desenvolvimento Sustentável ao município de Altos-PI. Eles buscaram conscientizar, inspirar e estimular ações sustentáveis, além de facilitar a interação entre os participantes e a formação de parcerias colaborativas para impulsionar a busca por soluções inovadoras e sustentáveis.

Semana Nacional de Ciência e Tecnologia

Já na exposição “Matemágica”, foram desenvolvidas atividades didáticas diversificadas (jogos, história da matemática, modelagem, recursos didáticos manipuláveis) no Campus. Conduzida pelo Prof. Acenilso Lima e alunos do Curso de Licenciatura em Matemática desenvolveram atividades de ensino voltadas para geometria, álgebra e/ou aritmética como curiosidades matemáticas, jogos e materiais didáticos manipuláveis para desenvolver temas da matemática de uma forma divertida e envolvente. Foi uma maneira de estimular o interesse pela ciência e mostrar como essa pode ser usada para criar ou solucionar acontecimentos do cotidiano.

O filme “O menino que descobriu o vento” foi exibido no CineADM, contribuindo para a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia de 2023 na conscientização sobre a importância das ciências básicas para o desenvolvimento sustentável. O filme mostrou como um jovem com poucos recursos foi capaz de usar a ciência e a tecnologia para resolver um problema complexo. Isso inspirou os participantes a acreditarem que eles também podem usar a ciência e a tecnologia para fazer a diferença no mundo. Após a exibição do filme, os participantes puderam discutir o filme e compartilhar suas ideias sobre como as ciências básicas podem ser usadas para promover o desenvolvimento sustentável. Essa discussão foi uma oportunidade valiosa para os participantes aprenderem mais sobre o tema e compartilhar suas ideias.

Em geral, a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia 2023 foi um evento bem-sucedido que contribuiu para a divulgação das ciências básicas e para a conscientização sobre a importância do desenvolvimento sustentável. O evento foi capaz de atingir um público amplo e de gerar discussões importantes sobre temas relevantes para a atualidade.

Semana Nacional de Ciência e Tecnologia

Como sugestões para próximos eventos desta alçada estão: aumentar o número de atividades voltadas para o ensino de ciências básicas para alunos da educação básica, promover mais ações de divulgação científica nas redes sociais e realizar parcerias com outras instituições de ensino e pesquisa para ampliar o alcance das ações apresentadas no evento.

RAFAEL SALES ALMENDRA é doutor em Ciência da Propriedade Intelectual – Universidade Federal de Sergipe (2022). Mestre em Administração e Controladoria – Universidade Federal do Ceará (2016). Atualmente é Professor EBTT do Eixo Gestão e Negócios no IFPI – Campus Campo Maior. E-mail: rafael.almendra@ifpi.edu.br

A EDUCAÇÃO COMO O DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL E ESSENCIAL À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

LUCAS FERNANDES DE FRANÇA
LUAN MACHADO ALVES
CATARINA NERY DA CRUZ MONTE

Para melhor compreensão do conceito de direitos humanos, é importante entender que eles são frutos de árduas lutas sociais e culturais, refletem as mudanças histórias e políticas por todo o mundo, influenciando, diretamente, na própria ideia do que é o ser humano.

Para a Organização das Nações Unidas (ONU), direitos humanos são normas que procuram reconhecer e proteger a dignidade de todos os seres humanos. Além disso, são uma categoria de garantias básicas universais e inalienáveis, ou seja, todas as pessoas têm direito a eles em qualquer lugar do mundo e ninguém poderá retirá-los ou extingui-los, mesmo que voluntariamente.

Segundo Severino, Ferreira e Rezende (2020) por Direitos Humanos entende-se aqueles em que o indivíduo possui unicamente por ser pessoa humana, tais como: o direito à vida, à saúde, à alimentação, à liberdade, ao meio ambiente sadio e equilibrado e, em especial, à educação. Compreende-se ainda que esses são decorrentes de determinadas circunstâncias, motivadas pelas lutas por liberdade e tendo seu surgimento de forma gradual.

Partido dessas conceituações básicas cabe demonstrar a relação entre direitos humanos e os denominados fundamentais. Inicialmente, vale lembrar que a natureza dos que são humanos transcende os fundamentais, haja visto que o mesmo abrange todos os povos e são válidos de forma definitiva, e em qualquer tempo, exaltando, por sua vez, princípios de caráter universais. Já os ditos fundamentais visam além do amparo individual humano, a coletividade, uma vez que objetivam uma proteção a dignidade em seu sentido mais amplo, moral e espiritual. Esses, são o conjunto de garantias institucionalizados, que teriam como finalidade básica o respeito à dignidade humana. Diante de sua relevância, possuem reconhecimento a nível constitucional, infraconstitucional, além de tratados e convenções internacionais.

Destaca-se que somente quando os direitos humanos são incorporados pelos textos constitucionais de um país, é que eles recebem o status de fundamentais, e a escolha sobre quais serão constitucionalizados pertence ao constituinte, que deve considerar quais valores são reconhecidos como essenciais em seu contexto social, político e cultural. Somente após esse processo legal é que serão tidos como fundamentais.

A partir dessa compreensão, e diante da importância que o ordenamento jurídico brasileiro reconhece à Educação, enquanto um direito fundamental, um dever do Estado e das famílias, esse texto busca discutir qual a importância de o Estado garantir Educação e reconhecê-la como um Direito Humano Fundamental? Para isso, apresentamos as temáticas dos Direitos Humanos e dos Direitos Fundamentais além da sua relação simbiótica, mostrando como o Estado brasileiro se mobiliza, para a promoção de uma Educação pública como um direito fundamental, básico do ser humano.

Temos por pressuposto que a Educação é reconhecida como um princípio constitucional básico de direito subjetivo, obrigatória e gratuita de caráter universal, econômico e social, como definido pela Constituição Federal Brasileira de 1988 (CF/88) e na esteira dos diversos documentos internacionais. Assumimos também, com esses documentos nacionais/internacionais, que a educação é a base para a realização de outros direitos tais como: saúde, liberdade, segurança, bem-estar econômico, participação social e política. O que reforça ainda mais seu caráter de essencialidade. Cumpre salientar que a presente pesquisa, de caráter qualitativo, se desenvolveu em meio de uma revisão literária, bibliográfica de estudos atinentes à temática, e documental, buscando os principais institutos sobre a temática. Justifica-se a empreitada no intento de corroborar para a formação de uma sociedade mais justa e igualitária.

Os resultados apontam para a necessidade do reconhecimento do direito à Educação em uma perspectiva ampliada, para além de meras representações, mas como verdadeiro direito fundamental e essencial à dignidade da pessoa humana.

1 SOBRE DIREITOS HUMANOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS

A discussão sobre os direitos humanos, e suas relações, é sempre necessária para o melhor aperfeiçoamento e exercício desses, nos termos propostos por Severino, Ferreira e Rezende (2020, p. 55) eles “são direitos fundamentais, reconhecidos no âmbito internacional, garantidos pelo sistema social do qual o indivíduo faz parte”, que guardam relação direta com valores e situações que julgamos ser essenciais e que não podem ser negociadas ou substituídas por interesses secundários.

Os direitos humanos não são decisões formais dos Estados, eles são “direitos naturais”: os documentos legais são apenas convenções jurídicas que os explicitam e estabelecem normas de procedimento por parte dos Estados e da própria coletividade, exatamente no sentido de exigirem o seu cumprimento e inviabilizar a sua violação. (Severino, 2019, p.44)

Eles podem ser compreendidos como resultado de um processo de expansão dos sujeitos e dos seus objetos, fruto de um interessante processo de especificação, considerando as necessidades sociais, políticas e históricas de cada momento vivido e influenciado por definições históricas,

prepondera o entendimento de que os direitos humanos são inerentes à preservação do estado de dignidade humana, com o significado de dignidade universalmente parecido e atrelado à subsistência humana, direitos válidos para todos os seres humanos, constituídos pelo engajamento social, com suas existências independentes do reconhecimento pelo direito estatal (Souza, 2021, p.160)

Partindo do conhecimento e do reconhecimento objetivo, e da necessidade de atribuir maior efetividade a essas normas, fez surgir a figura dos direitos fundamentais, que, em uma perspectiva simplificada, podem ser compreendidos como os direitos humanos que são reconhecidos no âmbito interno do Estado, formalizados, positivados e acolhidos nos ordenamentos jurídicos nacionais (Souza, 2021; Severino, 2019).

Evidencia-se que ao longo de todo o processo de reconhecimento dos direitos humanos foram várias as modificações dessas normas. A forma mais corrente de observação é a referida pela Teoria das Gerações, proposta pelo jurista tcheco-francês Karel Vasak e inspirada no lema da Revolução Francesa “liberté, égalité, fraternité”, respectivamente em português “liberdade, igualdade, fraternidade” e em suas aspirações axiológicas (Souza, 2021).

Essas evoluções também são atualmente reconhecidas no campo jurídico como dimensões, denominação empregada objetivando evitar a impressão errônea de substituição de uma geração por outra, bem como evitar a falsa ideia de que os direitos humanos surjam em períodos necessariamente sequenciais e excludentes.

A primeira geração dos direitos humanos e fundamentais tem seu surgimento relacionado ao ideal liberal da classe burguesa nas revoluções do século XVIII. Também reconhecidos como individuais, apresentam-se como de defesa e resistência na relação entre particulares e o poder estatal. Podem ser exemplos os direitos humanos a vida, a liberdade, a proteção da propriedade privada. Os de segunda geração, também chamados de direitos econômicos, sociais e culturais, são atribuídos às lutas dos movimentos sociais provenientes das classes econômicas mais baixas, que pleiteavam garantias trabalhistas e de assistência social, como saúde, educação e segurança. Esse período é caracterizado pelo Estado no bem-estar social, influência do ideário socialista (Souza, 2021)

Já os de terceira geração, também conhecidos como direitos de fraternidade e solidariedade, são originários de movimentos contrários às atrocidades experimentadas pela sociedade global no século XX, mais especificamente as barbaridades da Segunda Guerra Mundial. Dessa forma, diferentes grupos e categorias socias propuseram a consagração à paz, ao desenvolvimento sustentável, à proteção e equilíbrio ambiental, ao respeito à diversidade humana, e à autodeterminação dos povos como legítimos direitos humanos e fundamentais, evidenciando o caráter transindividual dessa geração (Souza, 2021).

Partindo dessa teoria de gerações, a existência de outras como a quarta, quinta ou quaisquer outras gerações ainda não é ou são pacificadas. Para uns, há gerações ligadas à ética na biotecnologia, para outros à efetiva participação cidadã nos movimentos democráticos, também há quem defenda uma geração ligada à proteção do meio ambiente, tendo em vista sua importância transindividual (Souza, 2021).

Após a segunda guerra mundial (1939-1945), e em consequência das barbaridades ocorridas ao longo desse conflito, percebeu-se uma grande sensibilização em relação à necessidade de proteção da dignidade humana, o que levou ao surgimento da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), promulgada em 1948 pela ONU objetivando influenciar a fundamentalização dos direitos humanos nas constituições dos Estados e defendendo a observância dos difusos, como a proibição de quaisquer discriminações raciais, étnicas e de gênero.

Com a Declaração, começa a se desenvolver o Direito Internacional dos Direitos Humanos. Este sistema normativo, por sua vez, é integrado por instrumentos de alcance geral, como o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (1966) e de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966) e por instrumentos de alcance específico, como as Convenções Internacionais. Firma-se, assim, no âmbito do sistema global, a coexistência dos sistemas geral e especial de proteção dos direitos humanos (Severino, 2019; Piovesan, 2005). Ou seja, de forma prática e objetiva está sempre na mão dos Estados a efetivação dos direitos humanos e fundamentais. Nesta ótica, os diversos sistemas de proteção interagem, dialogam, em benefício dos indivíduos, buscando sempre garantir-lhes as melhores condições.

  

2 O DIREITO FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO

É compreendido como um direito social, típico, um partícipe da chamada segunda dimensão. São múltiplas as menções à sua importância, seja no nosso texto constitucional, ou em documentos de caráter internacional (Henriques, 2020), por sua natureza ele exige ainda uma dimensão positiva do Estado, através de sua função legislativa ou por meio de políticas públicas efetivas (Alves, 2019).

Nos termos da Constituição Brasileira a educação tem caráter fundamental e social, prevista no Capítulo III, arts. 205 a 214, e é um dever nacional proporcionar e garanti-la a todos e todas. Em seus Arts. 205 e 206 a CF/88 informa que,

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I – Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II – Liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;

III – Pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

IV – Gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

V – Valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas;         (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VI – Gestão democrática do ensino público, na forma da lei;

VII – Garantia de padrão de qualidade.

VIII – Piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal.         (Incluído pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

IX – Garantia do direito à educação e à aprendizagem ao longo da vida.       (Incluído pela Emenda Constitucional nº 108, de 2020)

Após a leitura desses artigos, é possível extrair do contexto constitucional brasileiro que o direito à educação formal tem amplos significados relacionados, em vasta medida, à possibilidade de aprender, de ensinar, de propagar o pluralismo de ideias, e ao livre exercício de sua cidadania, através de uma gestão democrática e participativa, e da ampla valorização dos profissionais da educação, entre outros. Todos esses conceitos apresentam-se interrelacionados e podem ser compreendidos como elementos formadores de uma estrutura libertadora do indivíduo, capazes de promover sua gradativa emancipação social. (Severino; Ferreira; Rezende, 2020)

De forma ampliada e em uma perspectiva internacional, tal garantia também está prevista na Declaração dos Direitos do Homem, que em seu art. 26 afirma,

1 Todo ser humano tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A instrução elementar será obrigatória. A instrução técnico-profissional será acessível a todos, bem como a instrução superior, esta baseada no mérito.

2 A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos do ser humano e pelas liberdades fundamentais. A instrução promoverá a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e grupos raciais ou religiosos e coadjuvará as atividades das Nações Unidas em prol da manutenção da paz.

3 Os pais têm prioridade de direito na escolha do gênero de instrução que será ministrada a seus filhos. (Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948)

Percebe-se que a grande preocupação com a expansão do direito a Educação, caracteriza-se pela ampliação da escolarização e a confirmação da construção de uma formação escolar comum a todos, fundada no princípio da isonomia (Henriques, 2020). Afinal, em um atual contexto social caracterizado pela busca desenfreada pelo poder e a coisificação das pessoas, a Educação surge como um elemento de transformação social, e torna-se imprescindível, reconhece-la como um instrumento indispensável para que o indivíduo possa perceber-se como um agente protagonista na construção de uma sociedade mais democrática (Severino; Ferreira; Rezende, 2020). Nesse sentido,

A interpretação de seu sentido e alcance deve partir do pressuposto de sua profunda relação com os demais direitos sociais, como saúde, alimentação, trabalho, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância e assistência aos desamparados, assim como, submete-se ao regime constitucional da supremacia categorizado como cláusula pétrea e enquadrado no processo de aplicação e hierarquia dos tratados internacionais. (Werner, 2022, p.2)

Destaca-se que o acesso à educação, enquanto proposta de política pública, foi fomentado em inúmeros instrumentos normativos, tais como: a Constituição Federal Brasileira (1988), o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990), a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (1996), a Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), até instrumentos das agências multilaterais, como a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), entre outros.

Entretanto, embora seja um direito reconhecido e garantido, tanto pelo ordenamento jurídico brasileiro, quanto em documentos internacionais, ainda há desafios que impedem a ampla efetivação do acesso à Educação e permanência nas instituições de ensino, em nosso país, o que se deve, em larga medida, as evidentes desigualdades sociais, à crescente evasão escolar, problema muitas vezes provocado em decorrência necessidade de trabalho prematuro por parte dos estudantes, por outro lado, vale lembrar com Lorieri, Ferreira e Magalhães (2020, p. 41) que, ‘tratar a educação como um Direito Humano significa que ela não deve depender das condições econômicas do educando ou que deva sujeitar-se às regras do mercado”.

De maneira positiva e que merece destaque, segundo dados recentes divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE, 2023), a taxa de analfabetismo no Brasil era de 6,1% até em 2019, e em 2022 recuou para 5,6%. Porém o ponto negativo é que a maior parte do analfabetismo no Brasil é alta entre pretos, pardos, nordestinos e idosos. Os Estados com maiores índices de analfabetismo são o Piauí, Alagoas e a Paraíba. Já os menores índices ocorrem no Distrito Federal, Rio Janeiro, São Paulo e Santa Catarina.

Entre as 27 unidades da federação, as que mostraram as três maiores taxas de analfabetismo foram Piauí (14,8%), Alagoas (14,4%) e Paraíba (13,6%). Já as três menores taxas foram as do Distrito Federal (1,9%), Rio de Janeiro (2,1%) e de São Paulo e Santa Catarina (ambos com 2,2%) (IBGE, 2023)

 A pesquisa destacou ainda que a rede pública é a principal responsável pelo ensino no Brasil, tendo Municípios e Estados provendo os cursos de ensino fundamental e médio, e que mesmo os entes estabelecendo leis e regulamentos que garantem o acesso universal à educação, como uma obrigatoriedade e um dever, ainda assim temos uma grande parcela de nossa sociedade fora das instituições de ensino e que o abandono escolar se acentua entre os jovens a partir dos 15 anos,

dos 52 milhões de jovens com 14 a 29 anos do país, 18,3% não completaram o ensino médio, seja por terem abandonado a escola antes do término dessa etapa ou por nunca a terem frequentado. O Brasil tinha 9,5 milhões de jovens com 14 a 29 anos nessa situação, sendo 58,8% homens e 41,2% mulheres. Por cor ou raça, 27,9% desses jovens eram brancos e 70,9% pretos ou pardos. (IBGE, 2023)

Tais dados alertam para a necessidade, constante, da criação de modelos que sejam mais próximos das realidades sociais e históricas dos estudantes, abordando propostas pedagógicas diferenciadas e inclusivas. Não gerando apenas aprovações ou permanências nos sistemas educacionais, mas processo de aprendizagens consistentes e impulsionadores das potencialidades de cada um.

Destaca-se que o acesso à Educação é uma forma de promover justiça social, “principalmente diante de sua inquestionável capacidade de transformar o indivíduo e, consequentemente, sua capacidade de relacionar-se com a sociedade, transformando-a dialeticamente e contribuindo para construção de um mundo mais livre, justo e solidário” (Lorieri; Ferreira; Magalhães, 2020). Assim, para efetivarmos essa verdadeira modificação, emancipação e ampliação das autonomias do indivíduo é indispensável olhar para um modelo de educação para além das ideologias tecnocráticas e raízes excessivamente positivistas, mas que se encaminhe para a formação de pensadores questionadores, capazes de refletir sobre a vida e a condição humana.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Através de fontes bibliográficas e documentais, de leitura sistemática desses textos e de análise de seus conteúdos, este texto apresentou uma análise sobre a importância da Educação, como um direito fundamental, dever do Estado e agente de transformação social, um verdadeiro elemento potencializador e promovedor da emancipação, inclusão e promoção de uma sociedade mais justa e solidária.

Não resta dúvida de que o direito à educação é parte importantíssima dos direitos fundamentais, indispensável ao alcance e exercício da dignidade humana, tendo como base os princípios da isonomia e da universalidade. Dessa forma, o Estado não pode cercear este direito universal e indisponível do indivíduo.

Por outro lado, pesquisas recentes apontam que é notório que mesmo sendo um direito garantido em vários documentos, nacionais e internacionais, ainda se nota uma certa deficiência do Estado para assegurá-lo. Evidenciando que as ofertas educacionais devem ir além de uma aprendizagem meramente cognitiva, mas direcionadas, também, para as questões conscientizadoras e libertadoras, respeitando a diversidade e promovendo uma formação cidadã plena. O grande desafio é repensar as formas como o processo de ensino e aprendizagem se apresenta, para além de conteúdos e áreas previamente recortadas.

A universalização da educação básica é condição essencial para a disseminação do conhecimento socialmente produzido e acumulado e para a democratização da sociedade. Reconhecer a sala de aula como um espaço privilegiado é parte importante do processo, para a criação de políticas de ingresso e permanência nas instituições de ensino, que devem ser princípios norteadores da Educação.

É necessário e indispensável concentrar esforços e ampliar as políticas públicas direcionadas para a formação de cidadãos, com atenção especial às pessoas e segmentos sociais historicamente marginalizados, garantindo a todos e todas o amplo exercício dos direitos sociais e individuais, como valores supremos de uma sociedade fundada no pluralismo, da diversidade e nos preceitos democráticos, afinal, uma nação que não prioriza a justiça social, está fadada a protagonizar constantes desrespeitos aos direitos humanos, pois, nenhuma civilização se consolida sem educação.

REFERÊNCIAS

ALVES, Dora Resende. O direito à educação como direito fundamental. Revista Jurídica Portucalense / Portucalense Law Journal, nº 25, 2019.

BRASIL, Congresso Nacional. Constituição: República Federativa do Brasil. Brasília: Ministério da Educação. 1988.

Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/91601-declara%C3%A7%C3%A3o-universal-dos-direitos-humanos. Acesso em 25 de ago. de 2023.

HENRIQUES, Adolgo Vieller Souza. Direitos Humanos e Educação em Direitos Humanos. Educação e direitos humanos / Alexnaldo Teixeira Rodrigues, Antonio Carlos Gomes Ferreira, Bruna Franceschini, Danielle Ferreira Medeiro da Silva de Araújo, Flávia Gimenes e Gabriela Soares Balestero (organizadores). – Rio de Janeiro: Pembroke Collins, 2020.

IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Em 2022, analfabetismo cai, mas continua mais alto entre idosos, pretos e pardos e no Nordeste. Rio de Janeiro: IBGE, 2023. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de-noticias/noticias/37089-em-2022-analfabetismo-cai-mas-continua-mais-alto-entre-idosos-pretos-e-pardos-e-no-nordeste.  Acesso em 20 de set. de 2023.

LORIERI, Marcos Antônio. FERREIRA, Antônio Carlos Gomes. MAGALHÃES, Raimundo Mendes Pereira. Educação como processo de formação humana e de concretização dos direitos fundamentais. Educação e direitos humanos / Alexnaldo Teixeira Rodrigues, Antonio Carlos Gomes Ferreira, Bruna Franceschini, Danielle Ferreira Medeiro da Silva de Araújo, Flávia Gimenes e Gabriela Soares Balestero (organizadores). – Rio de Janeiro: Pembroke Collins, 2020.

PIOVESAN, Flávia. AÇÕES AFIRMATIVAS DA PERSPECTIVA DOS DIREITOS HUMANOS. Cadernos de Pesquisa, v. 35, n. 124, jan./abr. 2005

SOUZA, Maicon Melito. Teoria Geracional dos Direitos Humanos em doutrina, lei e jurisprudência. Revista de Direito do CAPP. Ouro Preto, v. 1, n. 1, set. 2021 | Página 159/231

SEVERINO, Antônio Joaquim. FERREIRA, Antônio Carlos Gomes. REZENDE, José Humberto de. A educação como direito humano e sua importância para a construção da cidadania. Educação e direitos humanos / Alexnaldo Teixeira Rodrigues, Antonio Carlos Gomes Ferreira, Bruna Franceschini, Danielle Ferreira Medeiro da Silva de Araújo, Flávia Gimenes e Gabriela Soares Balestero (organizadores). – Rio de Janeiro: Pembroke Collins, 2020.

SEVERINO, Antônio Joaquim. O compromisso da educação com os direitos humanos. In: NUNES, César A.; POLLI, José R. (orgs). Educação e direitos humanos: uma perspectiva crítica. Jundiaí: Edições Brasil/Editora Fibra/ Editora Brasílica, 2019.  p. 43-52.

LUCAS FERNANDES DE FRANÇA é aluno do curso de Bacharelado em Administração, IFPI – Campo Maior; fern4nd3zs2@gmail.com

LUAN MACHADO ALVES é aluno do curso de Bacharelado em Administração, IFPI – Campo Maior; luanm2567@gmail.com

CATARINA NERY DA CRUZ MONTE é professora do Curso de Bacharelado em Administração, IFPI – Campo Maior; Doutora em Políticas Públicas – UFPI, Mestra em Políticas Públicas – UFPI; Bacharel em Direito. catarina.nery@ifpi.edu.br

IV COPENE NORDESTE 2023 – O aquilombamento de vozes que reverberam pesquisa, poesia e (re)existência

NATHÁLIA MARIA LOPES DIAS
FRANCISNILTO DOS SANTOS NASCIMENTO
MICAELI RODRIGUES DE CARVALHO
NARA CHRISTINNA DA SILVA FONTINELE

RESUMO

O artiga explora as complexidades que permeiam a insubmissão de intelectualidades negras, focalizando na interseccionalidade entre gênero, raça e classe como um fator central. Destaca- se que a combinação tríplice dessas dimensões contribui para a visão equivocada de que pessoas negras não se inserem no universo do conhecimento científico e literário. No contexto da produção acadêmica, o artigo referencia a quarta onda do feminismo, conforme definido por Heloisa Buarque de Hollanda, que busca transcender as fronteiras acadêmicas e se manifestar em diversas formas, incluindo poesia, artes, música e cinema. No entanto, destaca-se a ambiguidade inerente ao “nós” feminista, conforme abordado por Judith Butler, que, ao buscar representar coletividade, pode inadvertidamente excluir algumas vozes historicamente silenciadas. Além disso, o artigo explora o COPENE – Congresso de Pesquisadores (as) Negros (as) – como um espaço crucial de luta e resistência, promovendo a representatividade e equidade no âmbito acadêmico brasileiro. Destaca-se ainda a importância da luta por equidade, representatividade e valorização cultural, utilizando o COPENE como um exemplo inspirador de como a união de vozes diversas pode contribuir para a transformação social, visando à construção de um futuro mais inclusivo e justo.

Palavras-chaves: COPENE; Vozes Negras; Resistência.

INTRODUÇÃO

Uma das estruturas que fortalecem o estado de insubmissão de intelectualidades negras, especialmente no que tange à produção de conhecimento científico e literário, é o sistema interseccional entre gênero, raça e classe. Nesse viés, compreende-se que essa combinação tríplice arca com uma visão de que pessoas pretas não produzem conhecimento científico. Nesse contexto, se considerarmos o perfil feminino no tocante à produção acadêmica, por exemplo, os prejuízos são ainda mais avassaladores. A chamada quarta onda do feminismo, definida por Heloisa Buarque de Hollanda (2018) como um movimento ativista que transcende as universidades e toma as ruas, promove discussões que abordam novas formas de feminismo: os feminismos da diferença, os feminismos na poesia, nas artes, na música, no teatro, no cinema, nas escolas, nas faculdades e em diversos espaços dominados por mulheres. A quarta onda feminista busca reavaliar os lugares de fala e analisar o sentido coletivo. Contudo, o “nós” feminista é uma construção fantasiosa que busca representar a coletividade, mas, ao mesmo tempo, exclui parte dessa clientela. (BUTLER, 2017, p. 245). Nessa perspectiva, essas vozes feministas, historicamente silenciadas, ressoam em poesias que reivindicam espaços de expressão que, por muito tempo, foram negado às mulheres.

Veloso, Andrade e Condorelli (2020) pontuam que precisamos enxergar através das lentes da racialização o porquê de vozes negras serem silenciadas ao longo da história. Assim, entende-se que esse apagamento pode ser entendido, na verdade, como reflexo de uma sociedade que marca relações sociais de poder através do patriarcado, racismo e divisões de classes.

Nesse contexto, conforme Mendes (2023), a partir de movimentos epistemológicos que abraçam corpos negros, tornam-se possível outras formas hermenêuticas de interpretar o mundo e, assim, transformá-lo de modo a desconstruir opressões seculares, levando em consideração a união coletiva. Desse modo, o COPENE – Congresso de Pesquisadores (as) Negros (as) – é um exemplo de movimentos importantes que abraçam em grande escala o coletivo de produtores negros de saberes. Nesse contexto, a poesia comporta-se como um mecanismo de luta e resistência também uma vez que a arte pode ser vista com viés emancipatório.

A POESIA COMO CORPO-INSUBMISSÃO

 Transformações na sociedade, como políticas, econômicas e culturais, influenciam a escolha de temas na literatura, como a configuração das cidades, movimentos de classes e contracultura. O corpo na literatura abrange discussões sobre liberdade, ética, estética, sexualidade, medicina e direito. Ao longo da história, o corpo adquiriu múltiplas dimensões, refletindo diferenciações em diversas áreas do conhecimento. O corpo é um espaço de memória individual e coletiva transmitida entre gerações. Ele se revela como um ponto de interseção das dominações de classe, gênero e raça, mas também como um espaço de resistência.

Nesse viés, Rosi Braidotti (1994) realizou diversos estudos abordando a relação entre o corpo e o feminino. Em sua perspectiva, elementos como a corporeidade, a sexualidade, a memória e a imaginação são fundamentais para a emergência da subjetividade política. O conhecimento feminista, segundo ela, é um processo interativo que revela aspectos da existência, especialmente as conexões com o poder que antes passavam despercebidas. Esse conhecimento nos leva a um terreno desconhecido, nos desestabiliza, nos afasta do familiar e nos lança para o estranho. A noção de ‘feminino’, abordada através da lente da diferença sexual, não é uma essência fixa, mas sim um projeto político que busca transcender a posição tradicional da Mulher como o Outro do Mesmo, buscando expressá-la como o outro múltiplo do Outro, conforme proposto pela teórica.

O corpo, por um lado, não se submete inteiramente às normas sociais, permitindo brechas para a subversão da identidade. Por outro lado, o corpo ancora o sujeito no mundo, possibilitando a percepção do espaço. Discursos e representações do corpo refletem transformações históricas, revelando relações entre subjetividade, objetividade, submissão e resistência. Imagens do corpo são uma lente para analisar a história, cultura e literatura, sendo a literatura um campo rico em representações do corpo, seja repetindo ou subvertendo estruturas. Dessa forma, a metáfora “o corpo escrito/a escrita do corpo” permeia análises da relação entre corpo e literatura o que nos permite inferir que, no século XXI, somos herdeiros culturais desse legado, reconhecendo o corpo como um ponto de conexão entre passado e futuro, profano e sagrado.

No cenário poético, por sua vez, é lícito pontuar que a poesia atua como um corpo carregado de simbologias e significados, especialmente no universo de vozes poéticas negras. Nesse viés, Paulina Chiziane (2013) sustenta que o mundo das mulheres, por exemplo, sempre foi caracterizado pela luta e resistência.

Ainda hoje a sociedade moderna considera os artistas como seus membros marginais. Ser mulher e ser artista torna-se um verdadeiro escândalo. Escândalo que tive que arriscar e suportar. Nesta sociedade a mulher só pode falar de amor e sexo com outras mulheres e também em segredo. Falar em voz alta é tabu, é imoral, é feio. (CHIZIANE, 2013, p. 12)

O depoimento proferido por Paulina Chiziane, escritora moçambicana, reforça a concepção de que  as autoras desempenham um papel fundamental ao inserir o discurso feminino em textos literários produzidos por mulheres, uma abordagem estética e ideológica ainda frequentemente marginalizada em nações onde o patriarcado machista é preponderante, especialmente em decorrência da influência histórica da colonização portuguesa. Essa situação se agrava quando o cânone literário, em grande parte, é dominado por obras escritas por homens.

Por outra vertente, pesquisadores negros, ainda que inseridos no universo masculino, têm sua capacidade intelectual muitas vezes questionada uma vez que vivemos em sua sociedade ansiosa por embranquecer o conhecimento. Não muito raro, têm-se eventos cotidianos que visam à camuflagem da identidade étnica brasileira e que consolidam o pacto de branquitude exposto por Cida Bento (2019). A construção ideológica desse embranquecimento passa necessariamente pela classe dominante e se desdobra por todos os segmentos sociais.

Numa sociedade na qual os saberes socialmente válidos não abrem espaços para que o negro se veja a partir da perspectiva do próprio negro para assim se autodesignar capaz têm gerado situações nas quais se perpetuam exclusão e baixa autoestima. Nesse cenário, lugares onde as questões étnico-raciais são postas em evidência, especialmente ligadas à cultura e à pesquisa, validam o fortalecimento de uma identidade para o próprio exercício da cidadania.

COPENE – ESPAÇO DE LUTA E (RE)EXISTÊNCIA

 Quando se reconhece a necessidade de inserção de negros, por exemplo, no cenário literário e de pesquisa, faz-se relevante pontuar sobre a criação de espaços nos quais essas vozes possam ecoar. Nessa perspectiva, para compreendermos melhor a importância de um evento que movimenta toda uma sociedade, especialmente quando evidencia pesquisadores negros, precisamos contextualizar a trajetória do COPENE

Existem já, felizmente, movimentações densas no cenário da produção acadêmica de pesquisadores negros. Nesse viés, a ABPN – Associação Brasileira de Pesquisadores(as) Negros(as) – é a idealizadora organizacional do Congresso Brasileiro de Pesquisadores(as) Negros(as) – COPENE; ela é uma associação sem fins lucrativos e apartidários cujo objetivo é defender a pesquisa acadêmico-científica da população afro-brasileira, com vistas à promoção da igualdade racial e ao combate ao racismo.

A primeira edição do COPENE institucionalizou-se em meados do ano de 2007, na Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Nordeste, tendo em vista que a ABPN sistematiza o evento em sedes divididas regionalmente; a saber, as regiões brasileiras Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul são aclamadas pelas edições bienais do Congresso de Pesquisadores(as) Negros(as). Destarte, no I COPENE 2007, intitulada por “Presença Negra no Nordeste para além dos Tambores: saberes culturais e produção de conhecimento”, acarretou um desígnio de propiciar a produção e a socialização do conhecimento de perspectiva interdisciplinar acerca dos saberes tradicionais e da produção de conhecimento.

Por conseguinte, entende-se o surgimento do COPENE como um marco significativo cujo intuito se dá pela busca da representatividade e da equidade, ao promover um espaço de discussão e reflexão a partir de pesquisas, conhecimentos e questões sociais relevantes para a comunidade negra. O COPENE, ao se consolidar como um catalisador de descobertas e discussões, fomenta a interdisciplinaridade ao incentivar colaborações e abordagens integradas para os desafios contemporâneos que afetam diretamente grupos historicamente marginalizados, tornando-se um instrumento de ampliação dessas vozes.

Outrossim, precisamos pontuar que os espaços dos COPENE’s estendem-se para além dos cientistas sociais, matemáticos, políticos, afro-brasileiros; são ainda espaços que acolhem intelectualidades indígenas como também simpatizantes com a luta antirracista, uma vez que a ação transformadora que almeja a equidade necessita das pluralidades sociais.

Em 2023, o COPENE – Nordeste aconteceu em Maceió-Alagoas, entre os dias 10 e 15 de novembro, com o tema “Duas Décadas das Ações Afirmativas: o legado de Palmares e o futuro das Políticas Públicas”. A escolha de Alagoas como sede do IV COPENE NORDESTE se deu na assembleia final do III COPENE NORDESTE e, além da UFAL, a Comissão Organizadora Local do evento também será composta pela Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL) e pelo Instituto Federal de Alagoas (IFAL).

Ao participarmos do evento, constatamos que as edições bienais dos COPENE’s são estruturadas a partir de conferências, simpósios temáticos, mesas-redondas, comunicação de pesquisas, painéis, feiras, lançamento de livros e intensa agenda cultural. Com a proposta também de apresentar à comunidade em geral as riquezas das culturas negras, além dos congressos nacionais, a ABPN também realiza os encontros regionais.

Vivenciar a quarta edição do COPENE Nordeste foi uma experiência transformadora e gratificante haja vista que foram muitos os momentos enriquecedores, com o compartilhamento de escrevivências de profundo impacto por estudantes, profissionais e pesquisadores de diferentes áreas. Tais perspectivas contribuíram para o fortalecimento de nosso compromisso com a pesquisa e, alicerçado nesse propósito, com a inclusão de fato.

Além disso, foi possível desfrutarmos de um momento de lazer em um dos principais pontos do evento, a Terra de Zumbi dos Palmares. A Serra da Barriga, em União dos Palmares, local símbolo de luta e resistência negra, culminou na formação dos primeiros quilombos liderados por Zumbi dos Palmares e sua esposa, Dandara; com certeza, essa exeperiência ficará eternizada em nossas memórias.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 O presente trabalho destaca a interseccionalidade como um fator determinante na perpetuação do estado de insubmissão enfrentado por intelectualidades negras na contemporaneidade. Ao explorar a quarta onda do feminismo, por exemplo, evidencia-se a busca por novas formas  de expressão e representação, que, embora busquem o coletivo feminista, enfrentam desafios na inclusão plena de vozes historicamente marginalizadas uma vez que o espaço literário está ainda ,dominado por estereótipos e valores patriarcais.

A reflexão sobre o Congresso de Pesquisadores Negros (COPENE) ressalta a importância desse evento como um espaço de luta, resistência e construção coletiva de saberes. O COPENE emerge como um catalisador significativo na busca pela representatividade e equidade, proporcionando um ambiente propício para a troca de experiências, discussões interdisciplinares e a valorização de saberes afro-brasileiros.

Ao participar do COPENE Nordeste, os autores destacam a experiência transformadora vivida no evento, enriquecida pelo compartilhamento de escrevivências e pelo fortalecimento do compromisso com a pesquisa inclusiva. A visita à Terra de Zumbi dos Palmares simbolizou, nesse contexto, a conexão entre passado e presente, reforçando a importância de preservar e celebrar as raízes culturais como elementos fundamentais na construção de identidades e na resistência contra opressões seculares.

Dessa forma, concluímos que a luta por equidade e representatividade, aliada à valorização de expressões culturais e à construção colaborativa de conhecimento, é fundamental para desafiar estruturas de poder patriarcais, racistas e classistas. O COPENE, como espaço de resistência, se torna um exemplo inspirador de como a união de vozes diversas pode contribuir para a transformação social, impulsionando a construção de um futuro mais inclusivo e justo.

Referências

BENTO, Cida. O pacto da branquitude. 1ºedição. São Paulo: Companhia das Letras, 2022

BRAIDOTTI, Rosi. “Between the no longer and the not yet: nomadic variations on the body”. No site No site http://women.it/cyberarchive/files/braidotti.htm , consultado em: 15 ago. 2023.

BUTLER, Judith P. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. 13. ed. Judith Butler; tradução: Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2017

CHIZIANE, Paulina. Eu, mulher… Por uma nova visão do mundo. Belo Horizonte: Nandyala, 2013.

HOLLANDA, Heloísa Buarque de. Explosão feminista: arte, cultura, política e universidade. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.

MENDES, Talita Rosetti Souza; FREITAS, Karine Aragão dos Santos. ENTRE OLHOS D’ÁGUA E INSUBMISSAS LÁGRIMAS: MÚLTIPLAS REPRESENTAÇÕES FEMININAS NA LITERATURA NEGRO-

BRASILEIRA DE CONCEIÇÃO EVARISTO. Revista de Letras Norte@mentos, [S. l.], v. 16, n. 44, 2023. DOI: 10.30681/rln.v16i44.11123. Disponível em: https://periodicos.unemat.br/index.php/norteamentos/article/view/11123. Acesso em: 30 set. 2023.

VELOSO, M. DO S. F.; ANDRADE, A. O. DE; CONDORELLI, A. Insubmissas mulheres negras: comunicação e interseccionalidade contra o epistemicídio. Esferas, n. 18, p. 6, 23 nov. 2020.

NATHÁLIA MARIA LOPES é professora Mestra do IFPI/Campus Piripiri; membro do NEABI/IFPI Campus Piripiri. E-mail: nathaliadias@ifpi.edu.br

FRANCISNILTO DOS SANTOS NASCIMENTO é graduando em Licenciatura em Matemática -IFPI/Campus Piripiri. E-mail: francisniltobruno@gmail.com

MICAELI RODRIGUES DE CARVALHO é estudante do Curso Técnico Integrado em Informática – IFPI/Campus Piripiri. E-mail: micaeli.email@gmail.com

NARA CHRISTINNA DA SILVA FONTINELE é graduanda em Letras-Português-Françês – UFPI/Campus Universitário Ministro Petrônio Portella. E-mail: narachristinna00@gmail.com

 

Ilustração | Marina Brito

 

O QUE SÃO DIREITOS CULTURAIS?

Um olhar para o templo de Nossa Senhora do Rosário, no lugar sítio Frecheiras, localizado no município de Cocal-PI

CATARINA NERY DA CRUZ MONTE
JOÃO ARAÚJO PASSOS

VIVEMOS EM UMA ÉPOCA em que os ideais de direitos humanos se deslocam entre os mais diversos ramos de estudo, construindo e reconstruindo novos diálogos, os quais nos levam ao debate, dentre outros temas, sobre direitos fundamentais e direitos culturais. No presente texto apresentamos a temática dos direitos culturais e de como eles ganharam relevância ao longo dos anos, após guerras e conflitos mundiais, tendo seu reconhecimento ampliado, repercutindo, inclusive na forma de compreender o que é Cultura.

Nesse cenário de modificações, partimos da ideia central de que direitos culturais são direitos humanos de caráter fundamental, e como tal, devem ser protegidos, resguardados e assegurados através de políticas públicas efetivas. Utilizamos o templo de Nossa Senhora do Rosário, no lugar sítio Frecheiras, localizado no Município de Cocal-PI, como um lócus específico de representação de direitos cultuais locais, apresentando seus elementos caracterizadores e a necessidade de sua proteção. A pesquisa tem base teórico-bibliográfica e documental, e os dados foram analisados buscando compreender o contexto social no qual foram inseridos.

Os resultados apontam para a necessidade do reconhecimento dos direitos culturais em uma perspectiva ampliada, para além de meras representações, mas como verdadeiros direitos fundamentais, o que reforça a necessidade de utilizarmos instrumentos legais de proteção e preservação, entre eles o tombamento.

[LEIA O ARTIGO COMPLETO]

CATARINA NERY DA CRUZ MONTE é doutora em Políticas Públicas, pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Mestra em Políticas Públicas pela UFPI. Professora efetiva do Instituto Federal do Piauí (IFPI). catarina.nery@ifpi.edu.br

JOÃO ARAÚJO PASSOS é especialista em História do Brasil pela Universidade Federal do Piauí (UFPI), Especialista em Gestão Pública pelo Instituto Federal do Piauí (IFPI). Professor Efetivo do Estado (Seduc-PI).

Ilustração | Adriano Lobão Aragão